Art. 4º do CTN:
“A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la:
I – a denominação e demais características formais adotadas pela lei;
II – a destinação legal do produto da sua arrecadação.”
Introdução
O art. 4º do CTN trata da natureza jurídica específica dos tributos, ou seja, define como deve ser feita a sua classificação dentro das espécies tributárias. A norma tem especial importância para evitar que a forma suplante a substância na identificação de um tributo.
Esse artigo protege o contribuinte e o sistema tributário de desvios legislativos e manipulações formais, ao estabelecer que o que define a natureza do tributo é o fato gerador, e não o nome que o legislador lhe atribui ou o destino que se dá ao valor arrecadado.
Elemento central: o fato gerador como critério de definição
O fato gerador é o acontecimento previsto em lei que, ao se realizar, dá origem à obrigação tributária (ex.: auferir renda, importar mercadoria, ter propriedade de imóvel urbano etc.).
Conforme o art. 4º, é esse fato gerador que determina a espécie tributária:
Se o tributo incide sobre a propriedade → é imposto (como IPTU ou ITR).
Se incide sobre a prestação de um serviço estatal ao contribuinte → é taxa.
Se está vinculado à valorização de um imóvel por obra pública → é contribuição de melhoria.
A consequência prática: ainda que a lei denomine um tributo como “contribuição”, se o fato gerador corresponder ao de um imposto, ele será juridicamente um imposto, com todas as consequências legais e constitucionais aplicáveis.
Irrelevância da denominação legal (Inciso I)
O inciso I reforça que a nomenclatura adotada pelo legislador é irrelevante. Em outras palavras, não é o nome, mas a substância do tributo que define sua natureza.
➡ Exemplo clássico: uma “taxa” criada por município com fato gerador desvinculado de qualquer serviço prestado ao contribuinte. Na prática, trata-se de um imposto disfarçado de taxa, o que é inconstitucional.
➡ Doutrina e jurisprudência aplicam o princípio da verdade material: o que importa é a realidade da situação jurídica e econômica, e não as aparências formais.
Irrelevância da destinação do produto da arrecadação (Inciso II)
O inciso II aponta que a utilização dos recursos arrecadados também não interfere na natureza jurídica do tributo.
➡ Exemplo: o IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores) tem sua arrecadação geralmente vinculada a investimentos em infraestrutura viária ou transporte, mas isso não o transforma em taxa ou contribuição. Ele continua sendo um imposto, porque incide sobre a propriedade de veículo.
Importância prática: evita que o Estado camufle contribuições ou invente novas espécies tributárias, desviando-se das regras constitucionais, ao simplesmente vincular recursos a determinada finalidade.
Jurisprudência e doutrina
A jurisprudência do STF é firme ao aplicar o art. 4º do CTN:
STF – RE 556.664/RS:
“O que define a natureza do tributo é o seu fato gerador, não sua denominação ou a destinação legal de seu produto.”
Na doutrina, Luciano Amaro enfatiza que esse dispositivo é uma manifestação do princípio da verdade material, fundamental para a segurança jurídica. Já Eduardo Sabbag o interpreta como uma cláusula de proteção ao contribuinte, contra “artifícios legislativos formais”.
Conclusão
O art. 4º do CTN estabelece um princípio essencial para a interpretação tributária objetiva e técnica: a natureza jurídica do tributo deve ser determinada com base em seu fato gerador, e não por conveniências nominais ou políticas.
Trata-se de uma garantia contra abusos do legislador, que impede a manipulação de rótulos e da finalidade arrecadatória para burlar o sistema de repartição de competências e as limitações constitucionais ao poder de tributar.